A
regularidade da constituição da sociedade cooperativa e da respectiva adesão do
trabalhador como associado não exclui a configuração de relação empregatícia,
uma vez que o quadro fático deve levar em conta o princípio da primazia da
realidade. O entendimento levou a 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho do
Rio Grande do Sul a manter sentença que reconheceu o vínculo de emprego entre
uma técnica de enfermagem e a cooperativa Intersaúde.
DICA: TRT DE SÃO PAULO: REVISÃO ATRAVÉS DE QUESTÕES (ACESSE AQUI)
Para
a relatora dos recursos, desembargadora Maria Helena Lisot, ainda que seja
possível a constituição de cooperativas para a prestação deste tipo de serviço,
tal modalidade comporta maiores restrições. É que o artigo 86 da Lei 5.764/1971
(Lei das Cooperativas) estabelece que estas podem fornecer bens e serviços a
não-associados, desde que atendam aos objetivos sociais e estejam em
conformidade com a legislação.
Segundo
a relatora, a cooperativa de trabalho traduz a união de pessoas que objetivam o
benefício mútuo por meio da combinação de esforços ou recursos, sem que haja
qualquer elemento de subordinação entre eles. Nesse contexto, os sócios assumem
a posição de destinatários dos benefícios alcançados pela cooperativa,
participando ativamente das decisões dela provenientes.
Assim,
a referida prestação deve ocorrer com vistas à consecução dos objetivos
sociais, distinguindo-se da hipótese prevista no artigo 3º da Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), em que há trabalho subordinado, pessoal, remunerado e
não-eventual.
‘‘Na
hipótese, a despeito de ter havido regular adesão da reclamante à cooperativa,
os demais elementos probatórios dos autos demonstram a existência de típica
relação de emprego. A prova oral demonstra que havia intermediação de mão de obra
da reclamante, a qual prestava serviços de forma subordinada’’, justificou no
acórdão. A decisão do colegiado foi tomada na sessão do dia 11 de dezembro.
O
caso
A
autora contou à Justiça que trabalhou, como técnica de enfermagem, para a
Cooperativa dos Trabalhadores Profissionais Autônomos em Hospitais, Clínicas,
Atendimentos Domiciliares e Serviços de Urgências Médicas por dois períodos: de
maio de 2006 a agosto de 2007; e de novembro de 2007 a março de 2010. Disse
que, apesar de ser admitida como cooperativada, trabalhava na condição de
empregada. Pediu reconhecimento de vínculo empregatício e o pagamento das
verbas trabalhistas rescisórias.
A
Intersaúde, como é conhecida, se defendeu, alegando que a relação entre as
partes se deu no âmbito da legislação cooperativista. Citou o artigo 442,
parágrafo único, da CLT: “Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade
cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem
entre estes e os tomadores de serviços daquela”. Logo, ausentes os requisitos
legais que ensejem reconhecimento da relação de emprego.
Em
sua defesa, a Cooperativa anexou aos autos vários documentos que atestariam a
relação de cooperação: a ficha de matrícula da reclamante, a solicitação de
ingresso, o ato de aprovação, as retiradas destinadas à obreira, os
certificados de registro e os recolhimentos de INSS — tudo nos termos da Lei
5.764/1971.
A
sentença
A
juíza substituta Lígia Maria Fialho Belmonte, da 16ª Vara do Trabalho de Porto
Alegre, observou, inicialmente, que o reconhecimento do disposto no artigo 442
exige ausência de requisitos legais para a configuração da relação de emprego,
como sinaliza o artigo 3º da CLT. Ademais, não pode haver o desvirtuamento do
cooperativismo; isto é, a autonomia da atividade dos cooperativados deve
prevalecer, na forma do artigo 3º da Lei 5.764/1971, complementou.
O
artigo 9º da CLT, segundo afirmou na sentença, diz que é nulo o ato praticado
com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos
contidos na legislação trabalhista. Assim, com base no quadro fático, entendeu
que houve, sim, trabalho prestado com pessoalidade, onerosidade,
não-eventualidade e subordinação, na forma do artigo 3º da legislação
trabalhista.
‘‘Destaco
que não foram realizadas assembleias em Porto Alegre, somente em São Paulo,
como reconhece a preposta da reclamada. Tal procedimento impede o exercício do
direito de voto e decisão por parte do ‘cooperativado’, o que constitui
desvirtuamento do princípio cooperativista. O fato de a reclamante ter prestado
palestras a respeito do trabalho cooperativado não afasta a conclusão de que,
considerando-se o princípio da primazia da realidade, houve labor na condição
de empregado’’, disse a juíza, reconhecendo o vínculo.
Fonte:
Conjur/Jomar Martins
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