A análise da faculdade concedida ao juiz nessa
súmula será verificada sob dois enfoques: a) da homologação do acordo e b) da
concessão de liminar.
No que tange à faculdade do juiz de homologar o
acordo judicial, é necessário frisar inicialmente que o processo do trabalho
sempre foi permeado pelo espírito da conciliação, vez que as Constituições
anteriores preconizavam ser a Justiça do Trabalho competente para “conciliar e
julgar”. No mesmo sentido, instituiu a Constituição Federal de 1988, em seu
art. 114. Com o advento da Emenda Constitucional nº 45/04, o constituinte
alterou o termo “conciliar e julgar”, incumbindo a Justiça Laboral de
“processar e julgar”.
Referida alteração não teve o condão de afastar o
contexto conciliatório da Justiça do Trabalho, vez que a norma
infraconstitucional é enfática na exigência de que todos os dissídios
individuais e coletivos serão sujeitos à conciliação (CLT, art. 764). O
processo laboral exige, no mínimo, duas tentativas conciliatórias. A primeira a
ser realizada na abertura da audiência (CLT, art. 846) e a segunda após o
encerramento da instrução processual (CLT, art. 850). Registra-se que a
tentativa de conciliação é considerada pelo texto celetista como um requisito
intrínseco da sentença (CLT, art. 831).[1]
A conciliação como meio legítimo, célere e eficaz
de solução de conflitos vem atualmente envolvendo os demais ramos do Poder
Judiciário, tendo como seu principal defensor o Conselho Nacional de Justiça,
ao procurar implantar a cultura de conciliação no País. Busca-se, com a
conciliação, a aproximação das partes, conferindo-lhes a definição do destino
do processo. Democratiza-se o processo, vez que permite que a sociedade se
auto-organize em seus conflitos de interesses.
No entanto, considerando que o processo judicial
acontece dentro do Poder Judiciário, incumbe ao juiz zelar para que a ordem
pública seja preservada, garantindo que verdadeiramente ocorra conciliação e
não mera renúncia de direitos, mormente no direito do trabalho, em que o
trabalhador é a parte hipossuficiente da relação. “A conciliação não é um fim
em si mesmo e não deve ser fruto da necessidade de sobrevivência do
trabalhador, especialmente quando desempregado”[2].
Assim, tendo o juiz o dever de respeitar a ordem
jurídica, ele poderá não homologar o acordo judicial se verificar a
inexistência de conciliação (ex., prejuízo iminente para o empregado, lide
simulada etc.), não existindo no caso direito líquido e certo à homologação do
acordo.
No que se refere à concessão de liminar, s.m.j.,
pensamos que não se trata de faculdade do juiz quando estiverem presentes todos
os requisitos para sua concessão, mas, sim, de direito da parte. Nesse sentido
leciona Nelson Nery Jr.:
Embora a expressão ‘poderá’, constante do CPC 273,
caput, possa indicar faculdade e discricionariedade do juiz, na verdade
constitui obrigação, sendo dever do magistrado conceder a tutela antecipatória,
desde que preenchidos os pressupostos legais para tanto, não sendo lícito
concedê-la ou negá-la pura e simplesmente. Para isto tem o juiz o livre
convencimento motivado (CPC 131): a) convencendo-se da presença dos requisitos
legais, deve o juiz conceder a antecipação da tutela; b) caso as provas não o
convençam dessa circunstância, deve negar a medida. O que o sistema não admite
é o ato de o juiz, convencendo-se de que é necessária a medida e do
preenchimento dos pressupostos legais, ainda assim negue-a. Esse ato seria
ilegal e, portanto, corrigível por MS.[3]
No mesmo caminho, José Roberto do Santos Bedaque:
Na realidade, não se trata de poder discricionário,
visto que o juiz, ao conceder ou negar a antecipação da tutela, não o faz com
conveniência e oportunidade, juízos de valor próprios da discricionariedade. Se
a situação descrita pelo requerente se subsumir em qualquer das hipóteses
legais não restará outra alternativa ao julgador senão deferir a pretensão.
(...)
Não tem o juiz, portanto, mera faculdade de
antecipar a tutela. Caso se verifiquem os pressupostos legais, é dever fazê-lo.
Existe, é verdade, maior liberdade no exame desses requisitos, dada a
imprecisão dos conceitos legais. Mas essa circunstância não torna
discricionário o ato judicial.[4]
Dessa forma, incumbe ao juiz preencher o conceito
legal indeterminado existente na norma (CPC, arts. 273, 461 e 798), por
exemplo, verificar a existência de verossimilhança da alegação, periculum in
mora, fumus boni iuris etc., e estando presentes os requisitos tem o
poder-dever de deferir a liminar, razão pela qual a mera denegação da liminar
ou seu deferimento, sem o preenchimento dos requisitos legais, fere direito
líquido e certo do requerente, podendo ensejar a impetração de mandado de
segurança.
Por fim, e reforçando a conclusão disposta no
parágrafo anterior, consigna-se que o C. TST paradoxalmente admite, na Súmula
nº 414, II, do TST a impetração do mandado de segurança com a finalidade de
questionar a concessão de tutela antecipada proferida antes da sentença. Assim,
sabendo-se que a tutela antecipada nada mais é do que a generalização das
liminares[5], ou seja, ambas possuem a mesma finalidade e natureza, podemos
concluir, de forma inequívoca, que a súmula em comentário deve ser interpretada
no sentido de que apenas a homologação de acordo constitui faculdade do juiz,
sendo, por outro lado, dever a concessão de tutela antecipada ou liminar quando
presentes os requisitos legais para sua concessão.
Aguardo vocês na próxima semana, quando
comentaremos a Súmula nº 377 do TST.
Texto extraído do livro Súmulas e Ojs comentadas eorganizadas por assunto, publicado pela editora juspodivm.
Conheça nosso Curso de Súmulas, Oj’s e informativosdo TST
[1]. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de
direito processual do trabalho . 6. ed. São Paulo: LTr, 2008. p. 92.
[2]. Almeida, Cléber Lúcio. In: ROCHA, Andréa
Pressas; ALVES NETO, João (org.). Súmulas do TST comentadas. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2011. p. 511.
[3]. NERY Jr., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11. ed. São
Paulo: RT, 2010. p. 549.
[4]. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela
cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. 5. ed. São Paulo:
Editora Malheiros, 2009. p. 386.
[5]. Expressão utilizada por Dinamarco in NEVES,
Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010. p. 1064.
Fonte: Portal Carreira Jurídica/Élisson Miessa


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